De partida para lado nenhum, a soprar estrelas para lá das nuvens...
"Last call for passenger..." anuncia através do sistema de som do aeroporto uma voz anónima, sensual, quente, decidida, que conforta e nos faz sentir, a cada um de nós, a pessoa mais importante da sala de espera. Fez-me lembrar de ti... De amantes a estranhos, anónimos, foi o nosso percurso demasiado rápido: de um céu perfeito ao abandono na poeira do tempo, um voo a dois reduzido hoje a silêncio e pequenos vislumbres de nós, como moedas esquecidas no bolso de um antigo casaco confortável...
Parei no caminho para beber café na estação de serviço, não por causa da qualidade (nada como um Nespresso, certo?), mas como quem quer parar o tempo para conseguir respirar, para olhar devagar para a vida que corre desenfreada à nossa volta, talvez para ver se, por conspiração do destino e por sincronização inesperada de todos os relógios do Universo, tu estarias ali, numa qualquer mesa, lá ao fundo, quem sabe, a beber o teu café com canela em pó, sem açúcar, com um lugar vago ao teu lado onde me pudesse sentar… Não estavas, claro, mas isso não me impediu de sorrir e abanar a cabeça…
Comprei o jornal, pedi um café, sentei-me, mas não li o jornal e mesmo o café acabou por esfriar intacto. Observei, apenas, tudo e nada, todos e ninguém... Saí e preparei-me devagar para fumar um cigarro, como convém num ritual, enquanto as pessoas chegavam apressadas, casais com e sem filhos, sem tempo a perder, sem reparar que eu as observava, eles quase sem se olharem, e acredito mesmo que alguns nem sequer tinham a noção do momento singular, fantástico, delicioso, que era estarem ali com filhos a empurrarem-se, com aquele "alguém" especial ao lado, um caminho para percorrer, um destino para onde ir...
Naquele fim de tarde o frio delineava o fumo que eu ia soprando para o ar, definindo-o por um breve e suspenso momento para logo desaparecer completamente, sem rasto, sem forma nem substância… "Sem saber bem como, nalgum momento desta vida tinhamo-nos desencontrado, talvez um de nós tenha chegado demasiado tarde, ou demasiado cedo, ou o outro não tenha sequer conseguido aparecer...", pensei, enquanto agarrava a gola do casaco para afastar o frio e os pensamentos... Quando voltei para o carro e me sentei confortável, no rádio estava a passar Sting (uma bonita versão do "Come down in time")… “Parabéns, onde quer que estejas!”, deixei escapar, num arrepio de pele, e voltei a sorrir enquanto abanava a cabeça devagar, pensativo, e colocava o carro a trabalhar, pois tinha um voo para apanhar…
É um mundo fantástico, este, e estamos todos nele... "Last call for passenger..." terei ouvido o meu nome?... De partida para lado nenhum, a soprar estrelas para lá das nuvens, nesta noite fria...