Aquele teu vestido Lacoste, azul...
O fim de semana anunciou-se com promessas de sol e encontrou-nos juntos. O tempo estava frio, mas a casa mantinha no seu interior o calor do sol que brilhou agradavelmente ao longo do dia. A salinha, acolhedora, convidava-nos a disfrutar de algum tempo tranquilo após mais uma semana de trabalho… A aldeia, já silenciosa naquela hora crepuscular, entregava-nos a paz do som da água que jorrava no fontanário do largo, ali perto. Os pássaros mais atrasados, num chilrear rítmico e puro, apressavam-se a recolher para os ramos dos grandes carvalhos que ladeavam o aglomerado de dez ou doze casas que constituíam o nosso paraíso…
Desde que entrámos na casa que alugámos, naquela pequena casa de pedra no meio da aldeia quase deserta, que desejo render-me aos teus lábios e fazer-me refém da tua pele... Coloquei a tocar o CD do Yamamoto Trio, antecipando o toque quente dos teus dedos no meu rosto, sorrindo com gosto pela concretização do tão desejado primeiro fim de semana juntos… Quando apareceste na sala, como que por coincidência, estava a tocar “It Could Happen to You”… Era a conjugação de todos os acasos da nossa vida, todas as ínfimas probabilidades se concretizavam ali, naquele instante: o som cativante do piano, tu e o teu perfume, tu e a tua pele macia, tu e o mundo inteiro à minha frente, tu e a primeira vez que te vi com óculos, tu naquele teu vestido Lacoste, azul, curto e justo, convergiram naquele instante como um vórtice, uma anomalia temporal que ligou passado e futuro emergindo num presente uno, completo e inevitável… Sustive a respiração por momentos, simplesmente arrebatado com tudo o que a tua presença significava enquanto, tão demoradamente como um segundo a conter a eternidade, tomava consciência de que não precisava de mais nada... Aconteceste-me, simplesmente, e foi nesse dia que soube que te iria amar para sempre...
Naquele fim de semana fomos todas as coisas que moveram o universo, nós e as promessas que os lábios trocaram, nós e os gestos decididos que nos libertaram da roupa, nós e todos os mistérios que sofregamente descobríamos em cada centímetro quadrado da nossa pele nua, nós e a música que nos tocava por dentro, nós e o mundo inteiro a renascer naquele átimo em que as nossas almas finalmente se reencontraram, com os teus olhos nos meus, as tuas mãos nas minhas e, depois, a explosão rouca, lenta, arrancada do fundo do que somos, num espasmo síncrono de corpo e alma, e outra vez, e outra vez, até nos quedarmos exaustos ali, naquela cama, naquele quarto, para sempre, nós e mais nada, nós, e éramos tudo o que havia…
O piano continuou a ouvir-se durante mais algum tempo, enquanto tu, de olhos fechados e com um sorriso que nos iluminava aos dois, te aninhavas no meu abraço e no nosso amor com a certeza de quem tinha, finalmente, chegado a casa...