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Entre Voos

A vida também acontece entre voos, entre momentos, entre o ontem e o amanhã. "Entre Voos" é um espaço de sentimentos feitos palavras, onde se espera pela vida como por um voo na sala de um qualquer aeroporto...

Entre Voos

A vida também acontece entre voos, entre momentos, entre o ontem e o amanhã. "Entre Voos" é um espaço de sentimentos feitos palavras, onde se espera pela vida como por um voo na sala de um qualquer aeroporto...

06
Mar16

Não tenho a certeza se me deste a mão naquele instante, ou se já nascêramos assim...

Entre Voos

 

Lembras-te?... O nascer do dia apanhava-nos invariavelmente a fugir pelas esquinas recortadas daquela aldeia antiga: tu nos teus trapos de princesa, eu com os meus melhores calções desbotados de cavaleiro andrajoso, e o nosso fiel rafeiro a fazer o papel de elegante corcel. Com o pão quente a queimar-nos a pele das mãos e os gritos dos incansáveis padeiros em nossa perseguição, escapávamos por entre becos e vielas, felizes com a antecipação do momento em que desfrutaríamos de tão delicioso e requintado banquete…

 

Ao virar da rua lamacenta, o fumo baixo das chaminés das pequenas oficinas dos ferreiros, qual nevoeiro mágico, encobria definitivamente a nossa fuga e emprestava leveza à eternidade que prometias no som que fazias ao dobrar o riso, o rosto a explodir com a excitação da aventura, o coração a bater descompassado com receio de sermos apanhados…

 

Foi naquela casa velha, a caminho do regato onde as criadas dos senhores das casas nobres lavavam a roupa, que demos o nosso primeiro beijo… Tolhidos atrás de um muro em ruínas que fizera parte de um quarto outrora vivo, os primeiros raios de sol daquela inesquecível manhã de inverno tocaram ao de leve no teu rosto, e lograram descobrir o ouro que trazias pendurado no fio dos teus longos cabelos… Não tenho a certeza se me deste a mão naquele instante, ou se fora durante a nossa correria, ou se já nascêramos assim... mas sei que estávamos de mãos dadas porque a tua mão estava a apertar a minha como se nunca mais me fosses largar…

 

Os olhos mais belos que alguma vez conheci brilharam envergonhados e, depois, lentamente, desviaram-se para o pão esquecido sobre o nosso colo. Partiste um pouco do teu e colocaste-o na minha boca, soltando uma gargalhada nervosa. Eu copiei o teu gesto, e dei-te um fragmento de um dos meus, ao que reagiste corando como só as princesas fazem… Trocámos os nossos votos assim, em silêncio, fitando-nos sem nunca mais desviar o olhar um do outro… Dei-te o primeiro beijo ali, casto como a inocência dos nossos frescos anos, puro como o nascer de um amor inevitável e eterno, como o reencontro de almas ancestrais...

Lembras-te?...

 

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