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Entre Voos

A vida também acontece entre voos, entre momentos, entre o ontem e o amanhã. "Entre Voos" é um espaço de sentimentos feitos palavras, onde se espera pela vida como por um voo na sala de um qualquer aeroporto...

Entre Voos

A vida também acontece entre voos, entre momentos, entre o ontem e o amanhã. "Entre Voos" é um espaço de sentimentos feitos palavras, onde se espera pela vida como por um voo na sala de um qualquer aeroporto...

14
Mai16

Sem pressa, sem dúvidas, sem remédio nem salvação, sem precisar de mais nada...

Entre Voos

 

A manhã acordou em tons de azul-chuva e envolvida num vento frio. As nuvens baixas, cinzentas e carregadas, lembram-me que ainda estamos em maio. Sentado numa cadeira ao lado da janela grande da sala, os meus olhos divagam pela linha onde o mar encontra a areia, interiorizando o silêncio da casa vazia interrompido aqui e ali pelos breves ruídos das gaivotas…

 

Lá ao fundo, vejo um carro madrugador que se aproxima da praia e para no estacionamento ainda deserto a esta hora. Ele sai a correr e dá a volta ao carro para abrir a outra porta e, entre risos e simuladas tentativas de resistência por parte dela, acaba por conseguir arrastá-la para sentir o momento, o mar, o ar, o som das ondas, o seu abraço… Ficam ali por momentos, apenas ali, ele a abraçá-la, ela abraçada ao abraço dele, com o cabelo comprido ondulando ao vento, abrigados num amor que dá sentido e esperança às palavras que ele lhe promete ao ouvido…

 

Diz-lhe que aprendeu com o perfume dela que a vida dele nunca mais será a mesma. Diz-lhe que ela cheira a prados que se estendem tranquilos na primavera, a flores que dançam na brisa do verão, ao ar que antecipa a desejada chuva na primeira tarde de outono, ao arroz doce quente e cremoso que o inverno convida a trazer para a mesa… Aperta-a um pouco mais entre os braços, desejando nunca mais a largar e ficam ali por momentos, pensativos, trocando silêncios e olhares... Carinhoso, ele ajeita-lhe o casaco enquanto a volta para si para a beijar sem pressa, sem dúvidas, sem remédio nem salvação, sem precisar de mais nada no mundo para além de quem está nos seus braços… Fita-a, deslumbrado, para depois lhe sorrir com aquele sorriso que sabe que a conquistou… De repente, massaja-lhe energicamente as costas e os braços para afastar o frio e depois, por entre gritos, risos e cabelos despenteados, refugiam-se dentro do carro... Partiram devagar, deixando ao mar a incumbência de recolher e conservar as emoções que entregaram ao universo…

 

Amar também é uma escolha… É querer fazer de cada dia o melhor dia da nossa vida, todos os dias. É saber que mesmo os ventos mais fortes (e existirão ventos capazes de nos derrubar) não conseguirão silenciar as palavras que trocamos ao ouvido desde o primeiro dia em que nos abraçámos… Amar é também aprender… É aprender que se ama sem esperar nada em troca senão fazer a outra pessoa sorrir. É aprender que só se vive uma vez e que lábios que se beijam assim não podem estar errados. É aprender que não há nada no mundo que um abraço tranquilo não solucione, em paz, a olhar o mar, da mesma forma que não há nada no mundo capaz de apagar as saudades de um amor que teima em nos habitar por dentro, como se lhe pertencessemos, como se tivesse sido impresso na alma há milénios...

  

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26
Abr16

Last rendez-vous...

Entre Voos

 

O som do mar amortece-me os sentidos… O sussurro das ondas pacifica-me os pensamentos… Este céu de verão quente e antecipado chegou devagar, com um denso negro pontilhado por incomensuráveis estrelas de todos os tamanhos… A lua ainda não surgiu mas, quando o fizer, estará cheia e será imensa, como o mais belo dos globos de cristal que algum dia existirão… Deitado e de olhos fechados, sinto nas costas o calor que a areia acumulou ao longo da tarde solarenga e que agora devolve ao meu corpo cansado... O som do meu coração junta-se ao constante murmurar das ondas que, incansavelmente, se deitam na praia, uma e outra vez, como o fazem há milénios, desde que te amo…

 

É aqui neste lugar mágico que me entrego ao universo, nesta fração de praia, neste fragmento de mundo… É aqui que tento compreender-me e compreender-te, compreender-nos. É aqui que tento aclarar as noites escuras que trago dentro… É aqui que peço perdão e que agradeço, é aqui que me deixo chorar e que renovo a esperança, é aqui que me encontro e que me perco, é que aqui que te sinto… Perante a imensidão do universo, não entendo como é que a nossa pequenez comporta um sentimento desta grandeza… O amor, o amor, o amor, o tudo e o nada juntos numa única palavra: amor…

 

Eu amei-te ali naquela praia, em silêncio e em gritos, em pranto e em risos, amei-te nos recantos da tua pele, no calor do teu peito, no fogo dos teus lábios, no ouro dos teus cabelos, na paz das tuas mãos, na luz do teu olhar, eu amei-te ali de todas as formas puras e escandalosas que conheço para que os deuses, ofendidos, te pudessem arrancar do meu peito e castigar-me com a desejada misericórdia de não mais te sentir… Mas até nisso eles falharam, vê tu… Ri-me de mim próprio e deles… Em silêncio sacudi os pensamentos enquanto o rumor distante das ondas, tranquilo, voltava a acordar o bater do meu coração…

 

A lua já apareceu, cheia e imensa como o mais belo dos globos de cristal que algum dia existirão… Levantei-me... Dei dois passos e parei para sacudir a areia das calças e da camisa… Algo me fez olhar para trás e então reparei que no sítio onde estive deitado, o luar recortava duas silhuetas na areia, uma ao lado da outra, como que de mãos dadas… Posso jurar que, nesse breve instante, a brisa me fez chegar a fragância do teu inconfundível perfume… Agradeci ao universo e, lentamente, regressei a casa... 

 

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03
Mar16

O meu nome é Cat... Lucky Cat...

Entre Voos

 

O meu nome é Cat!... Lucky Cat!... Lucky para os amigos… Podem tratar-me por Lucky… Esta é a minha casa, perto do mar, tranquila, com sítios interessantes em número suficiente para eu não me aborrecer… Tenho livre a maior parte do tempo que, com determinação, preencho a dormir na cadeira da sala que apanha sempre sol, ou a dormir no meio dos lençóis de um dos quartos lá de cima. Às vezes faço algum exercício, descendo as escadas até ao almoço, ou correndo atrás de presas imaginárias, como a minha pata esquerda ou a minha cauda…

 

Adotei duas humanas que, enfim, fazem razoavelmente aquilo que necessito, sem eu precisar de dizer muita coisa. Habitualmente chegam ao final da tarde e no dia seguinte saem de manhã cedo. Excetuam-se os fins de semana, onde tenho de partilhar com elas o meu espaço, mas é um mal menor… Por vezes até parece que me compreendem: passo por elas devagar dizendo “Pega-me ao colo! Pega-me ao colo!” e normalmente obedecem quase de imediato. Ou, quando me dirijo à lata de atum (que sei estar ao lado do lavatório, na cozinha), noto a preocupação delas em ir certificar‑se que tenho água e comida… Lindas!... Quando quero ir à rua, basta-me aproximar da porta de vidro que dá para o pátio e ficar a olhar, impaciente, lá para fora: rapidamente pedem desculpa e abrem a porta!… ou isso, ou salto para cima da mesa e faço cair uma ou duas coisas e o efeito é o mesmo… Bom trabalho de comunicação, digamos!...

 

Quando saio de casa para dar uma volta pelos canaviais ali perto, é quando me sinto mais livre. Corro, rebolo na areia e até subo a algumas árvores mais pequenas, especialmente quando aquele canídeo que vive na casa ao lado, insignificante e, convenhamos, um pouco lerdo, de nome “Chocolate” (imaginem!), insiste em pensar que quero brincar com ele. Mas enfim, uma corrida, um salto e “Adeus, Chocolate!” e… “Olá, Café”. Pois… A Café é uma gata :o) Nos dois sentidos, entendem? Preta no pelo, ainda mais escura nos olhos… Quer dizer, deve ser, pois cada vez que estamos juntos e os meus olhos encontram os dela, a minha capacidade de raciocinar fica ao nível da do Chocolate!… Faço-me entender?... Tenho a certeza que sim. Adiante. Na prática, este terreno que vai desde a minha casa até ao mar ali perto é a nossa área de lazer… Corremos, apanhamos pequenos animais, às vezes até um ou outro pássaro mais distraído… Um dia destes quis levá-la lá a casa, mas passei pela vergonha de chegar e ter a porta fechada… Claro que quando entrei sujei propositadamente o chão com as minhas patas enlameadas :o) “Bem feito!” – concordarão, penso, na medida em que deram cabo da minha tarde…

 

Das duas humanas, a mais dócil é a mais nova: faz tudo o que lhe peço. Salto para o sofá enquanto está a ver televisão, e compreende logo que quero que me tape com o cobertor e me deixe ficar ali no calor do seu colo… A outra é mais prática, trata das limpezas. Por isso, de vez em quando irrita-se e balbucia-me uma gatinhada qualquer que eu imagino sejam reclamações por ter alindado as minhas unhas no sofá, ou por não ter chegado a tempo à “casinha”… Nessas alturas fico a olhar fixamente para ela, conto até 10 muito sério, e ela acaba por voltar aos seus afazeres… Resulta sempre.

 

Eu sei, é um trabalho duro, mas alguém tem de o fazer. Bom, vou continuar a minha tarefa desta tarde, espreguiçando-me sobre o cobertor que pedi para colocarem estrategicamente ao pé da janela grande da sala, aproveitando o sol desta tarde de inverno. Espero que vocês façam o mesmo e aproveitem o que resta deste domingo!..

 

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18
Fev16

É abraçado a ti que todas as noites adormeço…

Entre Voos

 

Os habituais barulhos da cidade já se calaram há muito tempo. De perto, chegam-me os sussurros tranquilos do mar a cortejar a areia, numa dança diária, cuidada e paciente… A chuva fria que desaba a intervalos regulares, esbate os contornos da noite emprestando uma cintilação difusa às formas naturais que se adivinham ao longo da praia… O vento forte de hoje devolve-me o cheiro do sal roubado ao mar, impregnando os meus sentidos com este bálsamo único, premiando o meu torpor com este desmedido espetáculo, como se as forças da natureza tivessem conspirado entre si para hoje me gratificarem com o seu melhor desempenho… Mas noite alguma será capaz de me esconder o caminho até ti…

 

Sereno, observo da janela da sala, como se de uma tela enorme se tratasse, os milhares de tons de cinzento escuro e negro que compõe o céu… Volto-me e, em cima do sofá comprido e espalhadas à volta da guitarra, vejo as folhas com as letras e acordes das músicas que estive a tocar… Seguro na mão uma chávena de chá preto que saboreio encostado ao vidro da janela, na tentativa de afastar o frio que teima em se demorar dentro do peito… Ainda vibram em mim os acordes da música que toquei para ti. Os meus dedos percorreram as cordas da guitarra como se fossem fios do teu longo cabelo loiro e, durante esse tempo, senti que estavas ali, ao meu lado, com o rosto apoiado entre as tuas mãos, sentada em cima das tuas longas pernas cruzadas, ouvindo-me com uma manta à tua volta e, nos lábios, aquele sorriso que me ilumina…

 

Dói-me a distância que nos separa, rendido que estou às saudades que te tenho. Nenhuma das viagens que fiz te trouxe para mais perto, nem acalmou a nostalgia que os meus gestos e pensamentos denunciam. Olho para este lago interior e ele devolve-me sempre, teimoso, o reflexo do teu rosto sorridente... Tenho saudades das tuas pequenas coisas... De encontrar um cabelo teu no meu pullover azul; de te ver a colocar o batom, de manhã, em frente ao espelho, enquanto falas comigo e eu a cair para dentro dos teus lábios; de chegar ao armário e ter que desviar uma camisa tua, branca, no meio das minhas; de encontrar um brinco teu, ou um anel, na nossa mesa de cabeceira; de, ao fazer a cama de manhã, ser despertado pela clara insinuação do perfume que sempre deixavas nos lençóis; enfim, saudades de ti…

 

E depois estou cansado de responder aos outros: “Bom dia, sim, está tudo bem”, “Sim, bem melhor, o trabalho ajuda”… quero dizer-lhes que me fazes falta; gritar que te amo tanto como sempre amei; quero dizer-lhes que nada consegue atenuar a falta que me fazes ao sentido dos dias; que por vezes, nas minhas refeições solitárias, saboreio de memória o gosto do teu arroz doce, a textura do teu delicioso rolo de carne; quero dizer-lhes que me faz falta a luz do teu olhar, a segurança do teu abraço, a magia doce do teu perfume; que me faz falta percorrer a tua pele macia para nela saciar a sede da minha; que me falta a paz do teu coração e o sossego que as tuas mãos transmitem ao acariciar o meu peito… Posso ter-te perdido dos meus dias, mas é abraçado a ti que todas as noites adormeço: amo-te, sabes?...

 

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20
Jan16

A casa da praia...

Entre Voos

 

A casa da praia é um sítio mágico... Acordo tranquilo, com um dia inteiro, novo, pela frente. Quieto, absorvo o calor que me aconchega por baixo do edredão e, lentamente, vou tomando consciência do som das vagas que se deitam incansavelmente na areia da praia, lá ao fundo. Este som ritmado, tranquilizante, energizante, está sempre presente aqui, na casa da praia: abraça-nos com a inevitabilidade dos dias e das noites, a banda sonora ideal para compor a essência solitária no encontro comigo próprio. Medito, dando as boas vindas ao que o dia me ofertará…

 

Depois do pequeno almoço frugal, inicio uma caminhada na descoberta de novos caminhos de areia, pedras e erva rasteira, por entre pinheiros e canas, ao encontro da praia prometida no espanto sonoro entregue pela brisa fria que me deixa as mãos e o rosto vermelhos. Dentro de mim sinto a calma a tomar conta dos pensamentos e até os meus passos determinados se tornam demorados, alinhado que estou com o agora, com os cheiros a mar, a verde, a vida, a espaço, a tempo, a ti…

 

Ao chegar à praia não me teria admirado ver-te ali, sabes?, naquela duna, sentada numa toalha para te protegeres da humidade matinal que a areia absorveu, embrulhada no teu casaco quente, confortável, com o vento a alisar-te o cabelo, os olhos entregues à paz que o mar devolve, refugiada no teu jardim interior, naquele sítio para onde um dia me levaste pela mão e onde descobrimos o sentido de todas as coisas… Percorro a praia devagar, pensativo, sentindo a areia debaixo dos meus pés, sentindo o frio, sentindo o vento, sentindo a força do mar que, determinado, vai acariciando a terra e pacientemente beijando a areia, dia após dia, após dia, após dia...

 

Em casa, na ampla sala que se abre para a praia, dispersa-se no ar a fragância do incenso a Nag Champa que acabei de acender dentro daquela pequena caixa de madeira rendilhada, trazendo-te para o meu lado… Sinto que as nossas vidas são preciosas e, enquanto o meu olhar se dirige para lá - para aquele lugar eterno que só nós conhecemos -, uma calma tépida, pacificadora e empática, submerge os meus sentidos e arrasta-me para a cadência segura das vagas que se deitam continuamente na areia da praia, lá ao fundo, mágica, em que todos os caminhos me levam para ti, sem urgência nem hesitações, como sempre foi... 

 

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