Naquela hora incerta em que o fim do dia se torna um perfeito início de noite…
Duas folhas tombam da copa das árvores e caem a custo, devagar, como se o calor que hoje se sente tornasse o ar mais espesso, denso, palpável, transformando o seu lento rodopiar até ao chão num movimento hipnótico, riscado a castanho, vermelho e amarelo, como trechos de um filme em câmara lenta… Descem vagarosamente, as folhas, cruzando-se em movimentos descoordenados, tão lentos como a minha respiração… Este final de dia vem encontrar-me sozinho, sentado debaixo dos plátanos desta praça larga, convidativa. Espero... Num dos bancos virados para as escadas de acesso ao recinto, espero e observo as pessoas que passam com a tranquilidade de quem inicia o fim de semana, pisando as folhas acabadas de cair na calçada… Olho novamente para o relógio de pulso sem, no entanto, conseguir ver as horas…
À minha esquerda, noutro banco, um casal conversa... De vez em quando uma leve brisa faz-lhe voltear os cabelos no rosto e, de forma aparentemente automática, ela afasta-os dos olhos enquanto lhe sorri, segura, luminosa... Ele, por sua vez, sabe agora apreciar aquele gesto mais do que nunca, desde que se encontraram pela primeira vez… Tudo está no sítio certo, como sempre deveria ser: a temperatura do ar, as pessoas que se passeiam na praça, os plátanos que se meneiam lentamente libertando o seu adocicado e característico aroma, a musicalidade do riso dela, o toque casual da mão dele no seu braço, o olhar de cada um mergulhado nos gestos do outro e a cor do céu já no crepúsculo, naquela hora incerta em que o fim do dia se torna um perfeito início de noite…
Nas esplanadas apetecíveis, empregados diligentes começam a servir jantares para dois em mesas onde a luz de cada vela insinua contornos de lábios que se apetecem. Enquadrando vozes murmuradas e apenas interrompida a espaços por risos sonoros e tintinar de copos que brindam, ouve-se a Diana Krall numa melodia doce, suave, despertando emoções e convidando a um demorado toque de mãos em apaixonados que se querem desde sempre... Deambulo por entre desconhecidos sorridentes, aproveitando o tempo para deixar que o nervoso da espera se dissolva nos meus passos demorados enquanto me dirijo para o restaurante onde fiz a reserva. Sento-me à mesa e espero…
“Talvez consigas vir...” – penso, enquanto faço rodar no copo o vinho tinto acabado de servir e sorrio com as recordações que o gesto me desperta… Chegarás certamente com elegantes sapatos de salto alto, dentro de um vestido justo que contornará o teu corpo como um abraço meu, flutuando na segurança de um caminhar determinado, tranquila no modo casual como prenderás uma madeixa do teu longo cabelo louro atrás da orelha direita... A vertigem do teu olhar, quando me encontrares, dará forma às notas inconfundíveis do teu perfume que a brisa se encarregará de entregar, sem demora, ao arrepio que percorrerá a minha pele quando te aproximares e, sorrindo como se não nos víssemos apenas desde ontem, disseres: “Olá, desculpa o atraso!”... Sorrio... Talvez consigas vir, quem sabe?... E talvez, desta vez, fiques um pouco mais... Talvez te sentes ao meu lado e, como dantes fazias, me acaricies o rosto, fazendo com que o tempo pare... Talvez, por um instante eterno, o universo exista apenas por causa de ti, na luz do teu olhar quando encontra o meu...